Frenesi

10:48 PM Unknown 0 Comments


Eu estava agachado atrás do carro procurando alguma cobertura enquanto ouvia os sons dos disparos e dos projeteis acertando a lataria do carro já completamente alvejado.

 - Se não revidarmos eles vão nos flanquear! - Gritei para meu companheiro, sem saber se seria ouvido em meio ao barulho.
Tive minha resposta quando vi Harry acenar com a cabeça e correr meio que serpenteando em direção a ultima coluna de concreto de uma construção qualquer, ha muito destruída, fazendo com que parte dos projeteis fossem direcionados a ele.

"Filho da puta imbecil", pensei meio que agradecendo por ter alguém tão louco do meu lado. Imediatamente me levantei para responder aos disparos do inimigo e sorri ao ver que Harry já tinha um deles sob controle, preso atrás de uma pilha de entulho sob a chuva de tiros comandada por Harry.

Então algo se espatifou ao meu lado e vi que estava sendo alvejado novamente por outro dos meus inimigos e me joguei imediatamente de volta ao chão.
Meu movimento brusco deve ter dado ao meu adversário a ilusão de ter me acertado, pois por baixo do carro pude ver pés se aproximando.
Arrastei-me para debaixo do carro e aguardei a aproximação do inimigo, se eu desse sorte conseguiria pegá-lo desprevenido quando chegasse à lateral do carro. Vi que conforme se aproximava, o homem andava mais calmamente e tal atitude fez com que eu me preocupasse com Harry. Quando o maldito se aproximou o suficiente eu me arrastei da forma mais rápida e silenciosa que pude para fora da cobertura do carro. Não fui exatamente bem sucedido, pois ele acabou me vendo sair debaixo do carro, mas o fato de tê-lo pego de surpresa me ajudou, e aproveitando-me desse fato eu consegui chutar o joelho dele com força suficiente para desequilibra-lo e fazê-lo cair sobre os joelhos, e então num movimento rápido eu já estava de pé chutando-o mais uma vez, dessa vez na mão para desarma-lo, quando ele soltou a arma eu puxei a minha e apontei para a cabeça dele.

- Você se entrega? - Perguntei cheio de prazer e triunfo.
- Sim - Concedeu ele em tom mal humorado.
Nesse momento eu puxei o gatilho e vi o corpo do garoto sendo lançado ao chão pelo impacto.
- Chris seu puto, essa merda machuca - disse meu primo Jack, massageando a mancha de tinta em seu peito que demarcava o lugar onde eu o tinha atingido à queima roupa.
- Eu sei - Respondi rindo - Não pude resistir, desculpa.
- Tudo bem.
Estendi a mão para ajuda-lo a se levantar, e uma vez em pé e rindo junto comigo, parei para prestar atenção ao cenário criado para parecer uma cidade destruída pela guerra na arena de paintball e percebi que meu pai, Harry, e meu tio John tinham parado de trocar tiros para ver o resultado do meu confronto com Jack, que sempre era muito mais interessante do que os deles próprios.

 - Então acho que é mais uma vitória pro time masculino certo pai? - eu disse, querendo irritar Jack mais um pouco.
Para minha surpresa ele riu.
 - Você mal conseguiu acertar um tiro cara, quanto mais ganhar da gente.
 - E o que é isso aí no seu peito seu babaca? Sem contar na sua rendição cinco segundos atrás.
 - Beleza, essa fica pra você e pro tio Harry. Feliz aniversário seu bosta. - E então ele me surpreendeu com um abraço - Não é todo dia que se faz vinte anos cara, qual vai ser a boa pra hoje?
 - Aguarde e verás - Eu disse misterioso.
A verdade é que eu não podia dizer qual era a boa pra noite porque os pais de ambos estavam lá, e provavelmente estes não gostariam de ouvir o que eu tinha a dizer.
 - Então acho que podemos continuar com a programação certo filho? - Meu pai perguntou
 - Beleza. Próxima parada bar do tio Sam.

Eu tinha um relacionamento com meu pai que ia muito além dos laços de sangue, pra mim nós éramos muito mais que pai e filho, éramos amigos tão próximos quanto Jack e eu. Esse tipo de relação permitia que sempre que um de nós quatro fizesse aniversario, nos juntássemos para um dia de programas que iam do paintball até o bar do tio Sam, onde podíamos beber e ver algumas strippers enquanto conversávamos e gritávamos como os jovens que Jack e eu éramos e que nossos pais tinham sido um dia.

Mais tarde, já de volta à minha casa, comi um pouco do bolo de aniversário que minha mãe tinha feito pra mim e fui pro meu quarto pra me arrumar pra verdadeira comemoração do meu aniversário, onde pais não seriam permitidos, pois veriam a adolescência que tinham deixado para trás e prometeram que não deixariam seus filhos passarem pela mesma. Ao sair do banho me olhei no espelho e sorri, nunca fui o tipo de pessoa que pensasse que a aparência era algo a ser mais valorizado do que o cérebro. Ironicamente, porém, eu sempre chamei a atenção por causa desse atributo. Tinha olhos pretos como um céu noturno sem estrelas, um nariz reto e fino e uma boca bem desenhada. Mas o que eu gostava mesmo em minha aparência era meu cabelo que era preto como meus olhos e descia liso até meus ombros e emoldurava meu rosto.

Quando terminei de me arrumar olhei no relógio e vi que ainda era cedo para sair de casa, 23h30min, então liguei o computador reproduzi a playlist do Metallica e fui ver meu email e minhas redes sociais. Como era meu aniversário, minha caixa de entrada, assim como minha pagina no Chestbook, estava explodindo de votos de feliz aniversário. "Não vou responder porra nenhuma agora. Por que eu entrei nessa merda?" comecei a me perguntar. Então comecei a garimpar os emails que não eram sobre meu aniversário, lá pelo quinto achei um email de um cara que parecia só ter duas paixões na vida: pornografia e teorias da conspiração. O assunto era "Frenesi" e tinha um vídeo como anexo, logo pensei que era pornô barato "vai ter que esperar até amanhã". Desliguei o PC e fui pra minha festa.

No dia seguinte à festa acordei com o cérebro meio lento pela ressaca do álcool e das drogas que havia consumido na noite anterior então tudo que pude fazer por um longo tempo foi vomitar e tentar me lembrar dos acontecimentos da festa. Quando finalmente consegui me levantar liguei o computador, deixei rodando a playlist do Pink Floyd e fui até a sala avisar meus pais que estava vivo. Quando voltei ao meu quarto com água, sal de frutas e alimentos de fácil digestão me lembrei dos emails que tinha recebido no dia anterior e comecei a respondê-los.

Quando estava lá pelo quinto me deparei novamente com o email do Bob, o viciado em pornografia, e fiquei refletindo se seria prudente abri-lo. Estava a ponto de excluir o email quando reconsiderei e fui ver o conteúdo.
Havia um vídeo em anexo e uma linha de mensagem que dizia: Não é pornô seu pervertido.
Não pude evitar um sorriso ao ler a mensagem e pensei que só poderia se tratar de uma nova teoria da conspiração descoberta pelo Bob. Comecei a fazer o download do vídeo. Nunca fui um entusiasta dessas teorias, à exceção da que diz respeito ao 11 de setembro, mas sempre achei que algumas tinham argumentos muito interessantes e até mesmo plausíveis, por isso achei que seria interessante ver o que Bob havia reservado pra mim.
Abri o vídeo assim que o download terminou, e o que eu vi tirou meu sono durante muito tempo. O vídeo começava com uma mensagem de aviso "Cenas extremamente fortes" e cortava pra uma filmagem tosca, provavelmente de uma câmera de celular, de duas mulheres conversando, uma delas a própria "cinegrafista". Elas estavam no que parecia ser uma casa bem pequena, já que o cômodo em que se encontravam parecia ser a sala e mal acomodava a mobília antiga que decorava o local. Uma boa parte do vídeo transcorre com ambas conversando sobre nada em especial, quando uma batida forte foi ouvida na porta da sala, tão forte que foi possível ouvir o barulho de madeira se soltando.
- Quem é? - perguntou a mulher que estava visível no vídeo, demonstrando pânico na voz.
A única resposta que ela teve foi outra batida, ainda mais forte, na porta. Dessa vez foi possível ver farpas de madeira voando pela sala.

- Larga essa merda e sai pela porta dos fundos.
- Não.
Ambas correram para o que parecia ser a cozinha e cada uma pegou uma faca. Eu estava me perguntando por que a garota ainda estava com o celular na mão. Mas antes que outro pensamento pudesse se formar na minha cabeça eu ouvi um estrondoso barulho de madeira se espatifando, sinal de que o trinco da porta das mulheres no vídeo havia finalmente cedido. Quando as duas chegaram na sala se depararam com um homem de cerca de um metro e oitenta, careca e musculoso. A constituição física do cara nem de longe assustava tanto quanto a sua expressão. Ele tinha os olhos arregalados e absurdamente vermelhos e algo em seu rosto sugeria um ódio profundo, estava mostrando os dentes como um cachorro e salivando freneticamente. Concluí que ele estava infectado pelo vírus da raiva.

A primeira mulher não quis saber de nada disso e avançou pra cima dele enterrando a faca no peito do homem. Ele pareceu não sentir os trinta centímetros de metal que penetraram seu peito e jogou a mulher no chão com violência, a segunda mulher pareceu despertar de algum tipo de transe, largou o celular e só pude supor que também tentou atacar o homem. Nunca soube se seu ataque havia sido bem sucedido, mas ouvi o barulho de vidro se quebrando e algo batendo com força no chão e pude supor que ela tinha tido o mesmo destino da outra mulher.

Ao passar pelo celular o homem o chutou, tornando possível que eu visse a merda que viria a seguir. As mulheres já tinham se levantado e estavam se preparando para fugir quando o homem alcançou uma delas, ele agarrou o braço da mulher, a trouxe para junto dele e a mordeu, não como um ser humano faria, mas como um animal.

Ouvi a outra garota gritar quando viu aquela coisa arrancar com os dentes a jugular de sua companheira, o homem, porém pareceu se esquecer da outra mulher e continuou mordendo e dilacerando sua vitima. Foi quando a garota entrou no campo de visão da câmera com o que parecia ser a perna de uma mesa e acertou o homem com força suficiente para derruba-lo, em cima do celular, diga-se de passagem.

Quando o homem caiu deve ter pressionado algum botão, porque foi nesse ponto que o vídeo terminou, me deixando horrorizado e com uma pergunta martelando na minha cabeça: "O que era aquilo?”.

                                                                                                                 Conto por: Luiz Felipe

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